segunda-feira

Desabafar quando nao ha mais ninguem com quem falar Quantas vidas voce tem?

FRANKENSTEIN DO AMOR


Ouca

Eu entendo você. Como se seu pensamento fosse minha carne.

Passaram meses e você mudou de hábitos, mas não mudou de opinião.

Seus amigos cansaram de ouvir falar da mesma pessoa. Você apenas finge que não pensa nela. Você segue com igual ardência no peito, e desânimo.

Não tem mais ninguém para repetir as perguntas e as perplexidades do fim. Nenhum confidente mais suporta a insistência de sua lamúria.

Eu entendo você. Optou por ser silencioso, evitar as questões, para não incomodar mais ninguém.

Assumiu o feitio educado, exigiu demais do círculo de amizades, deu muito trabalho. E se calou.

Não que esqueceu alguma coisa, ou que cicatrizou, apenas se calou. Ainda prende o choro no carro, recebe buzinada pela distração, e as pálpebras continuam malabaristas de trânsito.

Eu entendo você. Gostaria de falar nela de qualquer maneira. Comigo, por exemplo. É me ligar e repetiria com o frescor de descoberta aquilo que decorei.

Você só faz novas amizades para falar dela, né? Adora desconhecidos para desabafar suas angústias conhecidas.

Você não cansa de amar, os colegas próximos cansaram, mas você não cansa, você não tem fim, é uma draga. É falsa a procura que não sai do lugar. A resposta é falsa para uma pergunta verdadeira. Não sabe o que aconteceu, não saberá o que acontecerá, e não interessa mais.

Jura que um novo dia poderia mudar toda a relação, mas não tem mais nenhum dia disponível para vocês.

Amor necessita ser a dois, sozinho é obsessão.

Não quero ser duro. Mas ainda espera o conselho perfeito. Ele não virá. Conselho perfeito é ter o que se quer. Não há quem recupere sua realidade.

Eu entendo você. Não pensa menos do que o último dia, ou o primeiro dia. Pensa tanto quanto antes. Já criou em si um percurso para explicar a história.

É uma neurose refinada, aposto que separou uma parte de sua rotina para evocá-la. Criou um santuário da separação. Vejo você reservando as horas antes de dormir para rezar e escutar a música preferida do casal.

Desligue as amarras. Nenhuma palavra recuperará o silêncio. Nenhuma. Não adianta sofrer como um cachorro na porta do prédio. O interfone é longe para suas patas.

Eu entendo você, meu amigo de dor quieta e acanhada, resignado a acordar e trabalhar e esperar a esperança como se estivesse esperando um bônus.

Isso que você sente não é mais amor, é culpa. E nem é mais sua culpa, tomou para si a culpa dela.

Você raciocina por ela, decide por ela, se posiciona por ela. Com a ausência e a falta de diálogo, com o distanciamento e a ruptura, normatizou o que ela acredita, a ponto de supor que ela não tem posse do sentimento tanto quanto você. Juntou pensamentos aleatórios, fragmentos da relação, frases ditas longe do contexto, e montou um frankenstein do amor de vocês.

Não estou brincando: toda dor é onipotente. Você delira supondo que conhece mais ela do que ela, e que ela não possui discernimento para definir pelo bem de vocês.

Confia que ela está sem condições para aceitar a volta, senão teria retornado. Como se ela fosse louca. Não é, meu querido, você é que enlouqueceu. Relação é cinquenta por cento a cinquenta por cento. E você age de modo unilateral, com autoritarismo.

Sua culpa emprestada é imaginar o que ela deseja. E você acha que compreende o que ela deseja. É tudo construção da carência.

Não há metafísica. Ele simplesmente não está mais a fim de você. Acabou. Repetirei o que os amigos não falam para não magoá-lo: ela simplesmente não está mais a fim de você.

Não existe jeito de avançar ou recuar, é trocar de estrada.

É divertido ser diferente. Muito divertido. Seus amigos também têm problemas, pode ouvi-los um pouco agora, eles precisam de você.

Beijo
Fabrício Carpinejar, o Lobo

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